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Meu feminino está de prosa e o entendimento
Caçar confusão, disse-me-disse, punhadinhos de insensatez ou coisas fora do lugar têm poder de ímã. E o contrário também. Tudo depende de quem conta, ou melhor ainda, de como replica o que vê. Até porque, qualquer intenção do escritor já sofre a primeira transformação de percepção quando despacha texto para o leitor de plantão.
Entende?
Afinal, quem pode me assegurar que você está compreendendo redondinho, do jeitinho que estou ofertando esse parágrafo?
Talvez você tenha subido na esteira de quem queira ler só uma pitada de uma curiosidade beira de estrada, ou deu um sossego no traseiro, aí, na poltrona.
Só por um trago de aberração política pra dar aquela cusparada engaiolada na goela, que só sai depois dessa espiada ventura… pois foi por você, que não dormiu por cem anos como aquela bela do castelo, que em rodapés de folhetins do início do século XX, um outro gênero de vestir a palavra pisou nas passarelas.
A crônica
Crônica, foi seu nome. Na pia batismal veio ocupar um espaço destinado ao entretenimento. Ainda bem, não é? Pior seria se fosse destinada ao sufrágio da alma. Melhor que naquele cubículo de jornal coubessem palavras com passaporte na mão carimbado e visto ilimitado para uma boa, breve e adorável viagem para o leitor.
A prosa
Afinal, a prosa tinha ardência de brevidade, concisão. Já nasceu assim, meio anãzinha, mas poderosa, a danada! Quem não quer esse bilhete premiado?
Em contrapartida as Namoradeiras¹ deram uma debruçadinha em outras janelas tornando-se mulheres cronistas dispostas à intimidade abrasiva do cotidiano.
Dado que grafia, estilo, rebuscamento literário também caem de moda, elas deixam os versos e trazem mais a informalidade brasileira de ônibus.
A crônica não parece um ônibus? Apinha gente que entra e sai no ponto seguinte, gente que se senta porque vai demorar a descer e fica ali, cada vez mais chegada ao narrador (esse aí perde até a parada), se servindo daquele tema. Importa se é ficcional, se a roupa ofertada lhe cai como um brinco? Aquele detalhe, o escondido, o que ninguém viu e nem tropeçou é o que dá liga. Ovo batido no bolo. Tem de ter mão, velocidade e leveza.
Um pouco mais
E um frescor na exposição da vitrine. Autores sem fronteiras linguísticas. Contra o vento, botam a desabar bandeiras hasteadas enquanto com palavrinhas mais errantes, sem luxo, pudor gramatical, nem casta, habitam os textos sem medo, porque não sofrem por antecipação. O cotidiano não fica inerte como um corpo estirado:
– Ressuscita-me! – grita. – O leitor me quer revisitado, reformulado. Talvez eu precise pagar penitência ou se não for pedir muito, absolvido. Dê-me essa redenção!
Nesse inventário plural de assuntos que outrora as namoradeiras abordaram, não se esconde um baralho inteiro de estímulos urbanos e humanos. Portanto, há cartas pedindo para serem puxadas e quem sabe se casarem com as do leitor. Desse modo, um pacto casamenteiro pode até causar uma aliteração entorpecente cutucadora. Um chá quebrapedras, não há tempo a perder.
Esse vale-tudo é um banquete dinâmico da conversação pela crônica, base da evolução natural de nossa espécie. Se me sinto atraída por modelos de produção de textos? Minha diversão predileta. O estranhamento me fisga. Se me incomoda, aí tem. Só um lápis e papel me devolvem o ar.
“Maria Iris Lo-Buono”
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Conheça um pouco mais acessando o instragram da autora
¹Namoradeiras em Quarentena Poemas nas janelas, 2020; Namoradeiras em Terapia, Poemas no Divã, 2021;